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VIOLÊNCIA DE GÊNERO Contextos e desafios

Claudia Maria  Poleti Oshiro

Colunista, Assistente Social,

desenvolve importantes trabalhos

na defesa e amparo a mulheres agredidas

na Região do ABC Paulista.

Pesquisadora da Violência de

Gênero e Religião na Universidade

Metodista de São Paulo

 

18 de Junho de 2015

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Historicamente a mulher tem sido tratada como inferior ao homem e como símbolo de reprodução. Em algumas culturas pelo mundo, a mulher é submetida às mais diversas humilhações e violência.

Em nosso país cresce o número de agressões contra a mulher, principalmente a violência sexual e a morte cometida por companheiros e ex companheiros. Em face de tantos casos alarmantes é preciso políticas públicas que garantam os direitos das mulheres e a mobilização da sociedade no enfrentamento à violência contra a mulher.

 

O conceito de patriarcado delineia as ideologias de gênero e as crenças culturais sobre a natureza das mulheres e dos homens nas mais diversas sociedades. É sabido que as diferenças entre homens e mulheres foram socialmente construídas e definidas historicamente.

Acreditamos que por ser uma construção social e estar em constante transformação, nos permite, no enfrentamento à violência contra a mulher, desnaturalizar estas diferenças através da nossa prática social. Quebrar alguns paradigmas não é tarefa simples, principalmente quando diz respeito à violência contra a mulher.

 

“Nada é mais comum do que a combinação de violência e poder [...] o domínio pela pura violência advém de onde o poder está sendo perdido; é precisamente o encolhimento do poder [...] a impotência gera violência” (ARENDT, 1994, p. 38 e 42).

Hoje a mulheres vivem em situação inferior aos homens, uma vez que lhes são oferecidas possibilidades menores, é sabido por exemplo, que a mulher ainda que exerça o mesmo cargo profissional que o homem, se ganha um menor salário.

 

A nossa humanidade é masculina com pensamentos e concepções masculinas, a mulher não é considerada um ser com desejos próprios. Para Beauvoir “O homem é o sujeito, o absoluto; ela é o Outro.”(1970, p.14)

Neste sentido, a relação dos dois sexos não é das duas eletricidades, de dois polos. O homem representa a um tempo o positivo e o neutro, a ponto de dizermos “os homens” para designar os seres humanos. A mulher aparece como o negativo de modo que toda determinação lhe é imputada como limitação, sem reciprocidade (Simone de Beauvoir, 1970, p.9).

 

Não raro as mulheres em situação de violência doméstica permanecem em seus lares violentos por não acreditar que existem diferentes alternativas de estar no mundo. Considerando o trabalho técnico, encontramos diversas dificuldades em compreender a violência, uma vez que, segundo Sandra Duarte de Souza (2002) “a violência de gênero implica em extrapolar os limites do visível”.

 

Ao partir do pressuposto que a violência sofrida pelas mulheres deixa marcas em seus corpos e suas mentes perturbadas, além do medo que favorece a subalternidade e a apatia, por que desejariam permanecer ou retornar aos seus lares? Estes e deveriam ser de afeto e confiança, mas só expressam dor e sofrimento.

Neste sentido, "para compreender o porquê de a mulher permanecer com quem a agride, torna-se necessário desvelar essa realidade oculta que oprime cotidianamente a mulher e a mantém no polo da subordinação" (Cardoso, 1997 b, p.136).

 

As violências reproduzidas com seus filhos(as), traz de imediato um entendimento da banalização da violência, que inclui uma das mais sérias e comprometedoras para o desenvolvimento da criança e do adolescente: o abuso sexual cometido pelos companheiros, muitas vezes pelo pai biológico.

Um dado interessante é que muitas das mulheres abrigadas nas Casas Abrigo Grande ABC são religiosas, com discursos religiosos muito parecidos, que tendem a justificar a violência vivida por elas, mas raramente verbalizam as violências sofridas pelas suas filhas e filhos.

 

Neste sentido percebe-se que há uma grande influência religiosa na vida das mulheres em situação de violência doméstica. É ainda um desafio compreender quais influências religiosas são essas que permeiam os mais variados lares, e de alguma forma autorizam simbolicamente a reprodução da violência pelos agressores, que atravessam gerações.

 

Quem são esses agressores? Alguns deles são formados por hiper-religiosos, o que lhes confere a aparência de virtuosos cidadãos (ALMEIDA; BANDEIRA 2004). Os agressores muitas vezes refletem o domínio das religiões que buscam o domínio das lendas, a de Eva por exemplo.

 

Muitos homens ainda se apegam à antiga moral, que vê na solidez da família a garantia de propriedade privada, bem como a emancipação da mulher como uma grande ameaça. Neste sentido, indagamos: será que a mulher não está sendo considerada uma grande ameaça para os homens?

 

Consideramos que o abrigo para mulheres em situação de violência doméstica com ameaça de morte, é um direito, porém, cumpre um papel social desafiador e contraditório, uma vez que conjuga o caráter provisório da medida, e ao mesmo tempo um espaço de vínculos e afetos, para lidar com situações complexas de abandono, violência e dor.

 

O abrigo é um espaço onde as mulheres necessitam se sentir protegidas e criar vínculos de confiança, acolhimento e socialização, que favoreça o desenvolvimento da autonomia e principalmente o empoderamento social e político, e assim sentir-se livres para realizar suas escolhas a partir dos seus desejos.

 

 

 

 

Referências

 

-ALMEIDA, T. M. C. Vozes da mãe do silêncio: a aparição da Virgem Maria em Piedade dos Gerais. São Paulo: MCT/PRONEX/Attar Editorial, 2003.

 

- ARENDT, Hannah. Sobre a violência.  Rio de Janeiro: 1994.

 

-CARDOSO, N. M. Mulher e maus-tratos. In M. Strey (Org.), Mulher:Estudos de gênero. São Leopoldo, UNISINOS, 1997, p. 127-138.

 

- BEAUVOIR, Simone. O Segundo Sexo – Fatos e Mitos. 1970

 

- SOUZA, Sandra Duarte, Violência de gênero e religião: alguns questionamentos que podem orientar a discussão sobre a elaboração de políticas públicas. Mandrágora, n. 11. São Bernardo do Campo: Universidade Metodista de São Paulo, 2007

 

- RIOS, Terezinha Azeredo. Ética e competência. São Paulo: Cortez, 2001.

 

 

 

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